domingo, 5 de fevereiro de 2017

Autor de marchinhas ‘banidas’ da folia diz críticas são ridículas

João Roberto Kelly é autor de "Cabeleira do Zezé", "Maria Sapatão" e "Mulata Bossa Nova"

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João Roberto Kely na redação da Infoglobo - Elcio Braga
RIO - Compositor de marchinhas como "Cabeleira do Zezé", "Maria Sapatão" e "Mulata Bossa Nova", consideradas preconceituosas por alguns blocos do Rio, João Roberto Kelly diz que as críticas às suas músicas são ridículas e que o carnaval é uma festa alegre e pura.
O que você acha dessa polêmica envolvendo suas composições?
Acho um pouco exagerada. Eu respeito todo mundo, todas as opiniões, mas acho que o carnaval é uma festa tão alegre, tão pura, é brincadeira em cima de brincadeira. O sujeito vai censurar uma letra de carnaval? No carnaval, o homem se veste de mulher, mulher se veste de homem, a gente brinca com careca, com barrigudo, brinca com todo mundo. A gente sai fantasiado de índio, sai assim, sai assado. No início, eu até pensei que isso aí fosse uma brincadeira de carnaval, mas depois eu vi que não, que eles estavam pegando pesado. Agora, não são todos os blocos não, são dois ou três só que estão criando esse caso. Se era para aparecer, meus amigos, vocês já apareceram, não precisa mais criar caso algum.
Você considera isso uma certa patrulha? O carnaval é uma festa tão libertária...
É uma patrulha, mas sem necessidade. O carnaval é isso, é todo mundo solto, todo mundo procurando fazer uma fantasia qualquer. E agora vem o politicamente correto, o que é, o que não é... Essas músicas todas têm por volta de 50 anos, e o povo as consagrou, o povo gosta de cantar. A maior alegria que eu tenho na minha vida de compositor é ver uma música minha do carnaval de 1964, por exemplo, como a "Cabeleira do Zezé", passando de geração em geração. Você vê hoje, nos blocos, até crianças cantando. Isso é a maior recompensa que posso ter do carnaval: ver a perenidade de uma canção, de uma marchinha, feita de uma forma bem simples.
Por que "Mulata Bossa Nova" está envolvida nessa polêmica?
Não entendi. Deve ser alguém que tem horror a mulata. Não posso entender. A música foi feita para uma Miss Brasil, chamada Vera Lúcia Couto. Eu estava no Maracanãzinho e vi aquela beldade, aquela criatura desfilando de uma forma magnífica, que fazia um passo diferente. Eu pensei assim: essa mulata aí está muito mais para o hully gully do que para o samba. Daí nasceu a "Mulata Bossa Nova", que simboliza o desfile da Vera Lúcia naquele concurso.
E "Maria Sapatão"?
É uma brincadeira gostosa, porque o Chacrinha me pediu para fazer uma música sobre a liberação sexual, algo engraçado. "Mas não vamos fazer uma coisa no sentido pejorativo, vamos fazer para brincar", eu disse a ele. Então tá lá. E a segunda parte da música é um elogio: "O sapatão está na moda, o mundo aplaudiu, é um barato, é um sucesso, dentro e fora do Brasil". O Chacrinha tinha loucura por essa marchinha.
Nos dias de hoje você acha que é saudável esse tipo de preocupação?
Não acho não. Acho que deveriam se preocupar com música que fala palavrão, que incita a violência. Aí, eu acho até que seria justo um certo patrulhamento. Eu não faria nunca, porque eu não patrulho nada. Na vida, eu acho que cada um faz o que quer. Dentro de um limite, evidentemente.
Você não acha que é importante marcar uma determinada posição com relação a esses assuntos, como identidade de gênero, preconceito?
Eu acho que, no carnaval, não. O carnaval é a grande fantasia que a gente veste. A gente se fantasia no carnaval de várias coisas. Não acho justo um patrulhamento tão minucioso.
O que você acha de acusarem as letras dessas marchinhas de preconceituosas?
Até certo ponto acho ridículo porque são músicas consagradas. São 40, 50, 60 anos. A mim, não incomoda em nada, absolutamente, porque nunca tive a intenção de ofender ninguém, pelo contrário.
Você sabe dizer por que essas marchinhas antigas acabaram ficando? São elas que fazem sucesso e são tocadas em todos os carnavais.
O povo gosta do que é bom. Então, evidentemente, foram músicas feitas com qualidade. O que falta hoje é divulgação. Antigamente, as músicas de carnaval eram executadas a partir do mês de novembro. Hoje até mesmo as músicas de escola de samba são pouco divulgadas nas rádios. Isso também tira o incentivo de a gente fazer música.
Mas esse ano você fez...
Fiz uma brincadeirinha, e é politicamente muito correta. O título é: "Ele não sabia de nada". O que te lembra isso? Ela diz assim: "Ele não sabia de nada, o circo pegando fogo, a jaula arrombada, procuraram pelo dono, cadê? Ele não sabia de nada".


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